FUNÇÃO HEPÁTICA
O fígado é um órgão metabólico muito importante no organismo, podendo ser considerado o “gestor” do metabolismo.Atualmente, são-lhe atribuídas pelo menos
1500 funções diferentes. De entre as maisimportantes cita-se a manutenção da homeostasia (equilíbrio dos níveis sanguíneos de glucose, aminoácidos e oligoelementos), a regulação do equilíbrio hormonal, a síntese de factores de coagulação, a participação na função imunitária, e a distribuição e destoxificação dos resíduos tóxicos endógenos do organismo. Entre estes resíduos endógenos, destaca-se a importância da amónia. A amónia é produzida no intestino quando a proteína
alimentar é degradada pela flora bacteriana intestinal. Quando o animal não recebe uma alimentação completa e equilibrada, a amónia pode ser produzida a partir da
degradação das proteínas musculares do animal (fenómeno conhecido por catabolismo
proteico). De uma forma reduzida, pode dizer-se que o fígado desempenha um
papel fundamental no metabolismo das proteínas, gorduras, carbohidratos, vitaminas
e minerais. O fígado possui uma capacidade de regeneração excepcional: no espaço de
algumas semanas, o fígado pode sofrer uma regeneração de 70% do seu parênquima.
COMO RECONHECER UMA INSUFICIÊNCIA HEPÁTICA?
Uma insuficiência hepática pode ter um carácter agudo ou crónico. Existem várias causas de insuficiência hepática no cão: lesões vasculares congénitas (hepatite devida à acumulação de cobre no fígado, frequente por exemplo na raça West Highland White Terrier) ou adquiridas, inflamação (hepatite) de origem viral, bacteriana ou secundária a uma parasitose (babesiose, por exemplo – um tipo de febre da carraça) ou a medicamentos. A icterícia (cor amarelada das mucosas do animal) é um sintoma característico das doenças hepáticas, porém, nem sempre é observável. Os sinais e sintomas mais comuns de disfunção hepática, não são, na maioria dos casos, muito específicos:
● Perda de apetite (anorexia)
● Perda de peso
● Ingestão de fluidos aumentada
(polidipsia)
● Aumento do volume de urina
(poliúria)
● Vómito e/ou diarreia
● Dilatação abdominal (ascite)
● Alterações neurológicas
● Letargia
Se o fígado não estiver a funcionar adequadamente, o organismo é incapaz de neutralizar as toxinas eficazmente. Nos casos crónicos, algumas destas substâncias tóxicas (a amónia em particular) podem atingir o sistema nervoso através da circulação sanguínea. Esta situação pode resultar numa síndrome neurológica designada
por encefalopatia hepática. Os sintomas desta afecção podem incluir colapso, tremores, salivação excessiva e alterações do comportamento, como por exemplo o animal pressionar a cabeçacontra uma parede.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO
O Médico Veterinário poderá realizar análises sanguíneas e de urina para avaliar a função hepática. A forma do órgão e as lesões do tecido hepático também poderão ser avaliados através de radiografias e ecografias abdominais. Nos casos mais graves, ou em que o diagnóstico não é conclusivo pelos métodos supracitados, poderá realizar-
-se uma biópsia hepática (colheita de uma amostra de tecido hepático que é
depois analisada para identificação de lesões ou sinais de doença). No entanto,
este método diagnóstico não é sempre acessível pois requer alguma experiência
e instrumentos específicos. Dependendo da causa da patologia hepática e dos sintomas exibidos pelo animal, o Médico Veterinário poderá prescrever alguns medicamentos específicos. O maneio dietético é frequentemente uma parte importante do tratamento das doenças hepáticas. O fígado recebe mais de metade do seu fluxo sanguíneo a partir dos vasos sanguíneos intestinais (que transportam sangue pobre em oxigénio e rico em toxinas), portanto, a adaptação da dieta de prescrição a estas características, pode ter um impacto substancial na quantidade de nutrientes e toxinas a que as células hepáticas estão expostas.
CARACTERÍSTICAS DA DIETA DE PRESCRIÇÃO
A terapêutica nutricional é essencial nos pacientes com insuficiência hepática.
A anorexia e a subnutrição são muito frequentes nestes pacientes, e, como tal, o clínico deverá monitorizar a alimentação do animal. O tratamento dietético da insuficiência hepática tem como objectivos prevenir a subnutrição do animal (através de um alimento com elevada densidade energética), favorecer a regeneração do parênquima hepático e minimizar as complicações metabólicas associadas (sobretudo a
acumulação de cobre no fígado, a encefalopatia hepática e a ascite.
As características mais importantes de uma dieta específica para alterações da
função hepática são:
Limitar a quantidade de substâncias tóxicas para o organismo
Se a dieta apresentar um teor proteico demasiado elevado, o organismo produz
um excesso de amónia. Se a dieta for deficiente em termos proteicos, a amónia é produzida pela degradação da proteína corporal do animal (geralmente, as proteínas musculares) por forma a compensar a carência deste nutriente na dieta. Uma vez que as bactérias do intestino grosso que digerem a proteína também produzem amónia, é importante que a proteína da dieta seja altamente digerível (com elevado valor biológico) para que possa ser digerida e absorvida no intestino delgado antes de atingir o intestino grosso. Uma proteína alimentar de elevado valor biológico,
limita, portanto, a produção de amónia a nível intestinal. A utilização de algumas
fibras alimentares específicas (fibras fermentescíveis) também pode ser utilizada para reduzir a produção de amónia pelas bactérias do intestino grosso e para estimular a excreção de amónia e de outras substâncias nocivas nas fezes. As fibras não fermentescíveis possuem também um efeito favorável, acelerando o trânsito intestinal e absorvendo uma parte das toxinas.
Fornecer níveis suplementares de energia
Uma contribuição suficiente de energia e proteínas é essencial para a prevenção
da perda de peso e da massa muscular, assim como para a prevenção do catabolismo
proteico (degradação das proteínas,frequente nos insuficientes hepáticos). Contrariamente à opinião generalizada, os cães e gatos com insuficiência hepática toleram perfeitamente níveis elevados de matérias gordas (30 a 50% de calorias). Assim, o fornecimento de energia sob a forma de matérias gordas, e a utilização de
proteínas de elevada digestibilidade, é essencial para assegurar a regeneração
hepática e reduzir a formação de amónia a nível intestinal.
Reduzir a acumulação de cobre no fígado
Uma vez assimilado no intestino, o cobre é armazenado no fígado e o excesso de cobre é eliminado pela bílis. Algumas doenças hereditárias e, sobretudo, as doenças hepáticas obstrutivas, dão origem à acumulação de cobre no fígado. O cobre em
excesso favorece a produção de radicais livres, os quais são responsáveis
pela lesão e morte das células hepáticas. Por conseguinte, nos regimes alimentares para insuficientes hepáticos, é aconselhável restringir o fornecimento alimentar de
cobre. Por outro lado, os alimentos ricos em zinco inibem a absorção de cobre (que tendencialmente se acumula no fígado destes animais) uma vez que o zinco (oligoelemento) estimula a produção de uma proteína nas células intestinais – a metalotioneina – que fixa o zinco e o cobre impedindo a sua absorção intestinal.
Ajustar os níveis de vitaminas e minerais
Nos animais com insuficiência hepática, as carências mais frequentemente observadas são em potássio e zinco (sobretudo devido à anorexia, já que o zinco tem uma origem alimentar), bem como em vitaminas (K e complexo B). Isto acontece porque ocorrem défices de produção (o fígado é responsável pela produção das vitaminas), aumento das necessidades e aumento das perdas (o potássio é eliminado na urina). Assim, nestes animais recomenda-se uma suplementação dietética com estes oligoelementos
e vitaminas. Além disso, nestes animais está recomendada uma restrição moderada de cloreto de sódio (sal) pode forma a prevenir um aumento da pressão sanguínea a nível
hepático (hipertensão portal) e a retenção de fluidos na cavidade abdominal (ascite).
A duração da prescrição depende da origem da patologia e da capacidade de regeneração do tecido hepático. No caso de afecções crónicas, pode ser necessário um tratamento durante toda a vida do animal, devendo respeitar as indicações do Médico Veterinário.
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